Através da deambulação, da recoleção e da degustação, embrenhámo-nos no verde das margens do rio Neiva e revelamos as múltiplas plantas bravias que constituem cada uma das suas matizes.
Tipologia do Projeto
#pedagógico #encomenda
categoriaS
#caminhada guiada #workshop #refeição #formação #sensibilização #investigação #publicação #território
Encomenda
Município de Esposende, no âmbito do Fórum Internacional de Arte e Comunidade
CURADORIA
Hugo Cruz
local
Margens do Rio Neiva (junto à sede da Associação Rio Neiva), Esposende
DURAÇÃO
12 de Novembro 2022
EQUIPA
Alexandre Delmar e Maria Ruivo, com Fernanda Botelho e Maria Tavares
Apoio
Associação Rio Neiva
Agradecimentos
Marina Costa e Diogo Zão
FOTOGRAFIA
A Recoletora, Mário Ferreira e Diogo Meira
Contexto do projeto
A convite da Câmara Municipal de Esposende, e com o apoio da Associação Rio Neiva, criámos uma atividade especificamente pensada para integrar o 1º Fórum Internacional de Arte e Comunidade (FIAC). A nossa atividade, que se desenrolou nas margens do rio neiva, estruturou-se em dois grandes momentos: 1º) Caminhada de identificação e recoleção de plantas espontâneas comestíveis; 2º) Confecção coletiva de uma refeição silvestre simples, em fogo-de-chão, seguida de almoço e conversa.
Sob o tema "Arte, comunidade e ambiente: diálogos para hoje", este Fórum proporcionou a apresentação, discussão e reflexão sobre as práticas artísticas comunitárias contemporâneas, nacionais e internacionais, e a sua relação com as questões ambientais. O território de Esposende tem vindo, ao longo dos últimos anos, a desenvolver um trabalho em rede, formal e informal, com diferentes dispositivos participativos, que de forma estruturada tem permitido um diálogo profundo entre arte e comunidades locais. Durante dois dias de programação intensa, o Fórum integrou o Seminário “Arte, comunidade e ambiente: diálogos para hoje”, assim como performances, residências artísticas e workshops, propondo ser um espaço de celebração dos diferentes protagonistas que tem potenciado estes processos artísticos e de cidadania, decorrendo em vários espaços do território de Esposende.
Vídeo-trailer de divulgação da atividade
SINOPSE DA ATIVIDADE
De todas as cores existentes, o verde é a cor da qual conseguimos distinguir mais matizes. Verde inglês, verde azeitona, verde tropa, verde menta, verde relva, verde garrafa, são alguns dos nomes que damos às várias tonalidades de verde que vemos.
De facto, o olho humano pode ver mais tons de verde (e identificá-los mais rapidamente) do que qualquer outra cor. E isso deve-se a fatores evolutivos, dos quais acredita-se que o mais proeminente seja o reconhecimento dos alimentos. Os primatas, o grupo de mamíferos do qual fazem parte os homens, evoluíram dos ancestrais arborícolas das florestas tropicais, que se alimentavam maioritariamente de folhas e frutos de plantas. Num contexto de sobrevivência, onde o verde é a cor predominante, existia uma clara vantagem na distinção de frutas verdes de frutas maduras (carregadas de açúcar), bem como de folhas jovens e tenras (mais comestíveis) de folhas adultas (mais amargas).
Verde é a cor das folhas das plantas, dos prados, das ervas, das árvores. O verde está por todo o lado e, talvez por isso mesmo, já não o “vemos” devidamente nem lhe prestamos a merecida atenção.
Atualmente, muito pouco ou mesmo nada sabemos sobre a vegetação que dá a cor verde ao nosso planeta, e a quem literalmente devemos a nossa existência. De uma forma geral, sofremos daquilo a que a dupla de botânicos e educadores Elisabeth Schussler e James Wandersee designou em 1998 por cegueira botânica, precisamente para descrever a “incapacidade de o homem ver ou perceber as plantas no seu ambiente.”
Na Recoletora queremos desconstruir a ideia de um verde indiferenciado. Acreditamos que aprender a valorizar as plantas espontâneas que se comem e que nos curam, sabendo os seus nomes populares e científicos, as famílias botânicas a que pertencem, a sua importância ecológica e os seus usos ancestrais e contemporâneos, é uma forma de restaurar os laços que nos ligam a todos os seres vivos; é uma forma de criar lugares de troca e de coexistência mais empáticas e equilibradas.
Texto por A Recoletora
Caminhada de identificação e recoleção de plantas espontâneas comestíveis.
Morugem (Stellaria media)
Azeda (Rumex acetosa)
Enquanto o Alexandre preparava o fogo-de-chão, caminhámos sobre diferentes camadas de verde com a herbalista Fernanda Botelho, analisámos as estruturas de várias folhas verdes, cheirámos inúmeros tons de verde, provámos novas texturas e sabores verdes — cítrico (Oxalis pes-caprae), mentolado (Mentha suaveolens), amargo (Plantago lanceolata), mucilaginoso (Malva sylvestris), doce (Foeniculum vulgare) e avinagrado (Rumex acetosa).
O receituário do “Verde adentro”, criado pela chef Maria Tavares, foi posto em prática coletivamente, sem pressas, ao ritmo do fogo-de-chão, num dia quente, quase de verão, como dita o S. Martinho.
Começamos por fazer o pão árabe, pondo literalmente a mão na massa, esticando-a em finos discos e decorando-os com flores de soagem e pétalas de onagra; De seguida fizemos dois pestos para barrar, um de morugem e avelã e outro de erva-azeda, malva, alho-bravo e amêndoa tostada, com a preciosa ajuda do pilão e da picadora manual; Para aquecer, saíram uns ovos revoltos de mostarda-brava e ansarina branca na chapa, e no pote de três pernas uma rica sopa silvestre, feita de várias folhas e castanhas assadas nas cinzas; De sobremesa, oferecemos bolachas de urtiga, com mel de mentraste e raspas de limão! Tudo regado com uma infusão bem outonal, à base de agulhas de pinheiro (com gengibre, mel, canela e laranja), perfeita para fortalecer o sistema imunitário; Para fechar o repasto não faltou o “café” de bolota.
Fomos raiz, cozinhando em conjunto num laboratório ao ar livre; Fomos semente, cultivando afectos; Continuamos a crescer, a ramificar e a espalhar a diferença a partir do conhecimento sobre as plantas bravias comestíveis.
ESPÉCIES Silvestres TRABALHADAS
A
Ansarina-branca (Chenopodium album)
Avoadinha (Conyza sp.)
Azedas (Oxalis pes-caprae)
C
Capuchinha (Tropaeolum majus)
Carvalho (Quercus sp.)
Caniço (Phragmites australis)
Cenoura-brava (Daucus carota)
D
Dente-de-leão (Taraxacum officinale)
Diabelha (Plantago coronopus)
E
Erva-armoles (Atriplex prostrata)
Erva-azeda (Oxalis pes-caprae)
F
Fetos (Pteridium aquilinum)
Funcho (Foeniculum vulgare)
H
Hortelã-de-burro (Mentha suaveolens)
L
Labaça (Rumex crispus)
M
Malva (Malva sylvestris)
Morugem (Stellaria media)
Mostarda-brava (Sinapis sp.)
O
Olhos-de-gato (Pentaglottis sempervirens)
Onagra (Oenothera sp.)
P
Parietária (Parietaria judaica)
S
Sabugueiro (Sambucus nigra)
Serralha (Sonchus oleraceus)
Silva (Rubus ulmifolius)
Soagem (Echium sp.)
T
Tabua (Typha latifolia)
Tanchagem (Plantago lanceolata + Plantago major)
Tojo (Ulex europaeus)
Trevos (Trifolium pratense)
U
Urtiga (Urtica dioica)